Mecanismo da Evolução


Caracteres novos e hereditários podem surgir por mutação de um único gene, ou por mutações cromossômicas, que resultam de vários acidentes que os cromossomos sofrem, como perda ou duplicação de um pequeno fragmento, inversão na posição de um pedaço, ou translocação de um fragmento de um cromossomo para outro. Qualquer dessas anomalias pode provocar uma alteração nos caracteres aparentes dos organismos.

Cada tipo de mutação ocorre com uma determinada freqüência. Calcula-se, por exemplo, que a mutação que produz a hemofilia ocorre com a freqüência de dois ou três genes em cem mil. A freqüência das mutações espontâneas foi medida para muitos genes na mosca-do-vinagre (Drosophila melanogaster), no milho e em outras espécies.

Em 1926, o geneticista americano Hermann Joseph Muller conseguiu, pela primeira vez, aumentar experimentalmente a freqüência das mutações na mosca-do-vinagre, submetendo-a aos raios X, trabalho que lhe valeu o Prêmio Nobel de fisiologia ou medicina em 1946. Muller demonstrou que a freqüência de todas as mutações aumentava proporcionalmente com a dose de raios X empregada. Outras radiações penetrantes produzem o mesmo efeito que os raios X, quando aplicadas em dosagens equivalentes.

O gás de mostarda, um dos componentes dos gases asfixiantes usados na primeira guerra mundial, mostrou-se tão ativo como os raios X, na produção de mutações na mosca-do-vinagre. Outras substâncias químicas também provocam mutações, embora em menor escala. A colquicina, alcalóide extraído da planta Colchicum autumnale, tem a propriedade de inibir a formação do fuso, durante a mitose: como resultado, os cromossomos duplicam-se normalmente, mas não se separam, de modo que a célula fica com o número de cromossomos dobrado. O calor também é um agente mutagênico: a freqüência das mutações em drosófilas dobra ou triplica para cada 10o C de elevação da temperatura ambiente.

Quase todas as mutações são inconvenientes para seus portadores, pois as espécies atualmente existentes resultam de um longo processo de evolução, pelo qual as combinações gênicas mais convenientes para os indivíduos, no ambiente em que vivem, foram fixadas como características normais da espécie. A alteração de um gene, ao acaso, tem grande probabilidade de ter conseqüência indesejável. Por exemplo, um novo gene que surja por mutação pode interferir no metabolismo de forma a tornar impossível a formação de um organismo viável; uma mutação desse tipo, que mata precocemente o organismo, é chamada letal.

Às vezes, a mutação não tem conseqüência tão drástica e produz um efeito que prejudica o indivíduo sem, entretanto, eliminá-lo. É o caso das mutações que produzem anomalias ou doenças hereditárias, como o albinismo e a hemofilia. Ainda outras mutações provocam apenas alterações ligeiras, que não chegam a ter valor adaptativo, isto é, não prejudicam nem favorecem seus portadores. São desse tipo as mutações que alteram, por exemplo, a forma de borda da orelha.

As mutações que produzem modificações extremamente pequenas, muito difíceis de serem percebidas, são, porém, as mais importantes para a evolução das espécies, pois têm maior probabilidade de dotarem seus portadores com alguma vantagem. Como as espécies já estão, em geral, muito bem adaptadas ao meio em que vivem, qualquer modificação radical será quase fatalmente prejudicial.

Exemplo clássico da ação da seleção natural é o ocorrido com populações de mariposas européias que habitam zonas industriais. Quase todos os indivíduos de cerca de setenta espécies diferentes de mariposas da Inglaterra perderam suas cores variegadas e ficaram uniformemente negros nas zonas fabris e suas vizinhanças. A mariposa inglesa Biston betularia, por exemplo, tem o corpo coberto por uma mescla de pintas brancas e pretas, o que faz com que ela se confunda com os liquens dos troncos das árvores em que pousa. Graças à proteção conferida por esse mimetismo, ela escapa da perseguição de seus predadores.

Em 1850, encontrou-se, perto de Manchester, um exemplar todo negro (melânico) dessa espécie, o primeiro a ser conhecido. Desde então, a variedade negra vem sobrepujando a forma pintada, que se tornou muito rara na região de Manchester. Para explicar uma transformação tão rápida e radical na composição de uma população, formulou-se a hipótese de que, nas regiões fabris, onde as árvores ficam cobertas de fuligem, a variedade pintada torna-se mais visível que a melânica, e é mais rapidamente exterminada pelas aves. Essa hipótese veio a ser confirmada experimentalmente: soltou-se igual número de indivíduos pintados e negros na floresta limpa e verificou-se que os melânicos eram devorados pelos pássaros em muito maior número do que os pintados. Quando a mesma experiência foi realizada numa floresta coberta de fuligem, perto de uma área industrial, o resultado foi inverso: os pintados é que foram dizimados.

É evidente que, mesmo antes do surto industrial na Inglaterra, as mariposas negras já surgiam por mutação; mas eram rapidamente destruídas, por serem muito visíveis sobre os liquens, e tinham, assim, pouca probabilidade de deixar descendentes. O tipo pintado, ao contrário, escondia-se melhor e produzia prole numerosa. Com a modificação do ambiente, a situação inverteu-se: a forma negra é que ficou sendo mimética, enquanto a forma pintada, mais visível em contraste com a fuligem, passou a ser eliminada.

Um bom reforço dessa explicação ocorreu quando novamente se passou a observar um aumento significativo na freqüência da forma pintada: é que, como resultado de medidas tomadas pelo governo para combater a poluição, os troncos das árvores tinham ficado mais claros, livres de fuligem.

A seleção natural age continuamente sobre todas as espécies. Um exemplo na espécie humana é o da anemia falciforme, doença hereditária comum em certas regiões da África. A anomalia é causada por um gene recessivo que determina a síntese de uma hemoglobina anômala nos glóbulos vermelhos do sangue. Os homozigotos quanto a esse gene morrem ainda na infância, mas os heterozigotos não manifestam a doença, embora possam ser reconhecidos por um tipo especial de exame de sangue.

Genes letais como esse são constantemente eliminados pela morte dos homozigotos, de modo que, em geral, suas freqüências se mantêm muito baixas nas populações. Surpreendentemente, verificou-se, porém, que certas populações africanas apresentavam freqüências altíssimas do gene da anemia falciforme.

Essa situação intrigou os geneticistas, até ser descoberta sua explicação: as populações africanas com alta incidência de anemia falciforme eram as que viviam em regiões de malária; as populações não expostas à malária apresentavam apenas raros casos da doença. Levado por esse indício, levantou-se a hipótese, depois demonstrada experimentalmente, de que os glóbulos vermelhos dos indivíduos heterozigotos quanto à anemia falciforme resistem melhor ao ataque do plasmódio da malária.

Ficou claro, então, que, nas zonas malarígenas, ter o gene da anemia falciforme, em dose simples, constitui grande vantagem, pois isso defende seu portador contra a malária. Assim, a seleção natural favorece o gene, em heterozigose, embora o elimine em homozigose. Como, em qualquer população, os heterozigotos são muito mais numerosos que os homozigotos, a freqüência do gene mantém-se elevada.

Uma alteração do ambiente faz com que certos tipos dentro de uma espécie passem a ser mais eficientes do que outros e acabem por predominar. Se todos os indivíduos de uma espécie fossem geneticamente idênticos, a seleção natural não poderia agir; mas as mutações estão sempre produzindo novas variações dentro das populações e, assim, promovem a variabilidade necessária para que a seleção natural possa influir na composição das populações, de acordo com as modificações do ambiente.

Entretanto, nem todos os genes nocivos vêm a ser eliminados pela seleção natural: os genes recessivos são mantidos, em certa freqüência, nos heterozigotos, que são fenotipicamente normais e podem transmitir o gene à metade de seus descendentes. Como os genes recessivos inconvenientes são muitos, embora cada qual exista na população em baixa freqüência, em média, cada pessoa é heterozigota para alguns genes recessivos prejudiciais.

Se o ambiente em que vive uma espécie fosse constante ao longo das gerações, tal espécie iria adaptando-se cada vez melhor a seu ambiente, pela substituição das combinações gênicas menos favoráveis por outras mais adequadas. Assim, a espécie evoluiria como um todo, sem se fragmentar em raças e espécies novas. O mais comum, entretanto, é que a espécie viva em diferentes micro-habitats, criados por alteração das condições do meio em partes da zona ocupada, ou que a espécie se difunda por regiões novas. Em ambos os casos, a seleção natural passa a atuar em sentidos divergentes nos diferentes habitats, de modo que as populações que neles vivem tendem a diversificar-se em raças distintas.

Outro fator importante na modificação genética das raças é a migração. Os índios americanos, por exemplo, são descendentes dos povos mongolóides asiáticos, mas deles diferem em vários aspectos, em razão da evolução divergente determinada pela separação dos dois grupos em continentes diversos.

Modificações na configuração geográfica podem dar oportunidade a importantes movimentos migratórios de plantas e animais. Um exemplo é a restauração da ligação entre a América do Norte e a do Sul, que tinham estado separadas pelo oceano desde o paleoceno até o fim do plioceno (o que representa cerca de 65 milhões de anos). Durante esse tempo, a evolução dos mamíferos tinha seguido rumos diferentes nos dois hemisférios, com a formação de espécies locais. Os fósseis do mioceno médio revelam que havia, por essa época, 27 famílias de mamíferos na América do Norte e 23 na América do Sul, sem que nenhuma delas existisse concomitantemente nas duas regiões.

Com a restauração do istmo do Panamá, as espécies da América do Norte invadiram a América do Sul e vice-versa. Essa troca de faunas redundou numa modificação radical no ambiente vivo dos dois continentes, o que provocou a extinção de muitas espécies sul-americanas, na competição com espécies mais eficientes provenientes do norte. No pleistoceno, entre as 32 famílias de mamíferos da América do Norte e as 36 da América do Sul, 21 eram comuns aos dois continentes.

Após a descoberta da América, muitas plantas e animais foram trazidos da Europa, da África e da Ásia, e nela se estabeleceram. Os ameríndios foram, em grande parte, aniquilados, deixando, entretanto, seus genes incorporados, embora em pequena proporção, ao patrimônio hereditário do grupo dominador, por meio de intercruzamentos.

Quando a densidade da população numa área atinge um nível alto, a sobrevivência fica difícil, os indivíduos são impelidos para fora da zona e a distribuição geográfica da espécie é ampliada. As regiões contíguas são ocupadas, a menos que existam barreiras intransponíveis. O novo ambiente conquistado pode ser diferente, de modo que a seleção natural segue nele novos rumos e, se a comunicação com a população inicial for difícil, a espécie pode dividir-se em duas.

Veja também:
Isolamento Geográfico e Reprodutivo
Origem das Raças

     
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